O quê?
O estudo OPTIVUS (Optical Coherence Tomography versus Intravascular Ultrasound-Guided Percutaneous Coronary Intervention) foi um ensaio clínico randomizado, de não-inferioridade, multicêntrico, aberto com adjudicação cega de desfechos, realizado na Coréia do Sul, comparando duas técnicas de imagem intravascular, o ultrassom intravascular (IVUS – intravascular ultrasound) e a tomografia de coerência óptica (OCT – optical coherence tomography), em pacientes submetidos a intervenção coronária percutânea (ICP).
Por quê?
Na ICP, sobretudo em lesões de alta complexidade, os métodos de imagem intravascular, como IVUS e OCT, podem otimizar os resultados do procedimento, ao permitirem uma melhor aposição do stent e o diagnóstico precoce de pequenas dissecções, além de cobrir maior extensão da placa. Entretanto, não se sabe se estes métodos se equivalem em termos de eficácia a longo prazo. Por isto, o estudo OPTIVUS testou a hipótese de que a OCT seria não-inferior ao IVUS.
Como?
O estudo randomizou pacientes com indicação de ICP e necessidade de implante de stent para duas estratégias de imagem intravascular: uso de IVUS versus OCT. Os pacientes apresentando infarto do miocárdio com supradesnivelamento de ST (IAMCSST), lesões tortuosas ou muito calcificadas e disfunção renal grave foram excluídos.
O desfecho primário do estudo foi o composto de morte de causa cardíaca, revascularização do vaso-alvo ou infarto relacionado ao vaso alvo, em 1 ano. Os desfechos secundários foram, além dos componentes individuais do desfecho primário, a mortalidade por todas as causas, AVC, trombose de stent, sangramento BARC (Bleeding Academic Research Consortium) 3-5 e nefropatia induzida por contraste.
A fim de declarar a não-inferioridade, os autores determinaram uma margem de aumento de risco absoluto de 3,1% com o OCT, para uma taxa esperada de desfechos de 8% ao ano para o desfecho primário.
Estrutura PICOT | |
Population: | Pacientes com indicação de ICP |
Intervention | ICP guiada por OCT |
Control: | ICP guiada por IVUS |
Outcome | Morte cardíaca, infarto ou nova revascularização |
Time | 1 ano |
E aí?
Foram incluídos 2008 pacientes, sendo 1005 alocados no grupo OCT e 1003 no grupo IVUS. A idade média dos pacientes era de 65 anos, 21,5% eram do sexo feminino e 33% tinham diabetes mellitus. O escore SYNTAX médio foi de 15,5, e cerca de metade dos pacientes apresentavam lesão de bifurcação.
O desfecho primário ocorreu em 25 (2,5%) pacientes do grupo OCT versus 31 (3,1%) do grupo IVUS (diferença absoluta de risco -0,6; intervalo de confiança 95% -2,0 a 0,8; P para não inferioridade < 0,001; hazard ratio [HR] 0,80 IC 95% 0,47-1,36). A mortalidade foi semelhante entre os grupos, 1,0% versus 1,4%, respectivamente (HR 0,71; IC 95% 0,32-1,60). Não houve diferença entre os grupos na ocorrência de nova necessidade de revascularização (1,6% versus 1,9%, respectivamente; HR 0,84; IC 95% 0,43-1,63), sangramento BARC 3-5 (1,0% versus 1,3%, respectivamente; HR 0,77, IC 95% 0,34-1,75) ou nefropatia induzida por contraste (1,4% versus 1,5%, respectivamente; HR 0,93; IC 95% 0,45-1,91).
E agora?
A melhora dos resultados da ICP tem ocorrido ao longo dos anos em virtude de melhores plataformas de stent, experiência dos operadores, manejo de terapia antitrombótica e chegada de métodos de imagem intravascular. Assim sendo, as ICP de alta complexidade podem se beneficiar do advento tanto da OCT como do IVUS, em casos selecionados. O estudo OPTIVUS traz informações relevantes para a prática clínica ao comparar “head to head” ambas as técnicas. O estudo se beneficia do desenho randomizado, multicêntrico e avaliando desfechos clinicamente relevantes. Pontos fracos seriam o fato de ter sido realizado em um único país e o desenho aberto, ou seja, tanto operadores, como pacientes e médicos assistentes sabiam a que grupo os pacientes haviam sido randomizados, embora os desfechos tenham sido avaliados de maneira cega.
Em estudos de não-inferioridade, como o OPTIVUS, algumas observações devem ser consideradas para a correta intepretação dos resultados. Em primeiro lugar, somente faz sentido se testar uma hipótese de não-inferioridade quando o tratamento novo (grupo intervenção) tiver uma potencial vantagem em relação ao tratamento controle, como menor custo, maior conveniência ou menor risco. Assim, a lógica desse tipo de estudo é provar que o novo tratamento pode oferecer tal vantagem sem sacrifício da eficácia. Em segundo lugar, quando se estabelece a margem de não-inferioridade, o pesquisador está determinando “até quanto se aceita perder”. Em outras palavras, no pior dos cenários (leia-se: intervalo de confiança), o novo tratamento ainda perderia por um limite clinicamente aceitável. Ao se fazer isso, é importante se julgar com cautela o que é clinicamente aceitável (o que nem sempre é tarefa fácil!), e se observar qual é a taxa de eventos esperada e aquela que foi observada no estudo. Os pesquisadores consideraram que essa taxa aceitável (margem de não-inferioridade) seria um aumento de 3,1 pontos percentuais contra a OCT, para uma taxa esperada de eventos de 8,0% ao ano (ou seja, um incremento de cerca de 40% no risco relativo). Entretanto, a taxa observada de eventos no estudo foi de 3,0%, ou seja, mantendo a margem de não-inferioridade na escala absoluta, seria o mesmo que dizer que é razoável o dobro de eventos contra o novo tratamento (talvez já não seja tão clinicamente aceitável).
Diante das considerações anteriores, e com o agregado das evidências, os métodos de imagem intravascular como IVUS e OCT devem ser considerados em casos selecionados de ICP de alta complexidade a fim de otimizar os resultados do procedimento. A seleção do método em si vai depender da disponibilidade, custos e experiência do operador.