A Importância da Perda de Peso no Controle da Hemoglobina Glicada e do Diabetes Tipo 2 - MDHealth - Educação Médica Independente
quarta-feira dez 18, 2024

A Importância da Perda de Peso no Controle da Hemoglobina Glicada e do Diabetes Tipo 2

Escrito por: Samara Alves em 19 de novembro de 2024

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O diabetes tipo 2 é uma doença crônica que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, com sérias consequências para a saúde. No entanto, estudos recentes mostram que intervenções focadas na perda de peso, como dietas de baixa caloria e cirurgia bariátrica, podem ser extremamente eficazes no controle da doença, oferecendo a possibilidade de remissão. Saiba mais sobre os estudos que comprovam esses resultados e como mudanças no estilo de vida podem ajudar na redução dos riscos de complicações graves, como doenças cardiovasculares e insuficiência renal. Clique para ler mais sobre essas estratégias que podem transformar o manejo do diabetes tipo 2.

 

O diabetes tipo 2 (DT2) é uma condição de saúde crônica que vem crescendo a cada ano, impulsionada principalmente pela obesidade, sedentarismo e hábitos alimentares inadequados. Caracterizada pela resistência à insulina e elevação dos níveis de glicose no sangue, o DT2 pode resultar em complicações graves, incluindo doenças cardiovasculares, neuropatias, insuficiência renal e até mesmo amputações1, 4. No entanto, diversas pesquisas científicas mostram que intervenções voltadas para a perda de peso podem ser uma das estratégias mais eficazes para o controle dessa doença, como evidenciado nos estudos Swedish Obese Subjects (SOS)5,6,7, United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS)1,2, Diabetes Remission Clinical Trial (DiRECT)3, e Look AHEAD (Action for Health in Diabetes)4. 

O acompanhamento do tratamento em pacientes com diabetes é frequentemente feito através da hemoglobina glicada (HbA1c), que reflete a média dos níveis de glicose no sangue nos últimos 2 a 3 meses. Níveis elevados de HbA1c indicam um controle glicêmico inadequado, aumentando o risco de complicações associadas a doença1. O UKPDS1,2, um dos maiores estudos de longo prazo sobre diabetes tipo 2, acompanhou pacientes por até 24 anos e demonstrou os benefícios do controle glicêmico intensivo. O grupo que recebeu tratamento intensivo (com sulfonilureias ou insulina) apresentou uma redução média de 0,9% na HbA1c em comparação ao grupo de controle. Essa redução foi associada a uma diminuição de 26% nas complicações microvasculares e uma redução de 17% no risco de infarto do miocárdio a longo prazo. Esses resultados reforçam a chamada “memória metabólica”, onde o controle glicêmico rigoroso, mesmo após o término da intervenção, continua proporcionando benefícios significativos para a saúde. 

A perda de peso, especialmente em pacientes com sobrepeso ou obesidade, é uma abordagem comprovada para melhorar a sensibilidade à insulina e reduzir os níveis de glicose no sangue3. Estudos indicam que até mesmo uma redução modesta de 5-10% no peso corporal pode melhorar significativamente o controle glicêmico e reduzir as complicações relacionadas ao diabetes tipo 23,4. 

A cirurgia bariátrica tem se mostrado uma opção eficaz para a perda de peso em indivíduos com obesidade severa e diabetes tipo 25. No estudo SOS5,6,7, que acompanhou pacientes por uma média de 20 anos após a cirurgia, os resultados indicaram um aumento na expectativa de vida de 3 anos a mais do grupo que realizou a cirurgia. Após 10 anos, as perdas de peso foram cerca de 25% para bypass gástrico, 16% para gastroplastia com banda vertical e 14% para banda, em comparação com o peso inicial. Após 15 anos, as perdas de peso correspondentes foram de cerca de 27%, 18% e 13%, respectivamente. A maioria dos pacientes (72,3%) com diabetes que realizaram a cirurgia experimentaram remissão após 2 anos. A proporção de pacientes cirúrgicos em remissão diminuiu para 38,1% e 30,4% após 10 e 15 anos, respectivamente, mas permaneceu maior do que nos controles (5,3% e 6,3%; após 10 e 15 anos, respectivamente). Portanto, para pacientes obesos com diabetes tipo 2, a cirurgia bariátrica foi associada a remissões mais frequentes do diabetes e menos complicações do que o tratamento usual. 

A dieta de baixa caloria é outra intervenção eficaz no controle do DT2, como avaliado pelo estudo DiRECT3, que consistiu em substituição total da dieta (825–853 kcal por dia por 12–20 semanas), reintrodução gradual de alimentos (2–8 semanas) e, então, suporte estruturado para manutenção da perda de peso3. Depois de 2 anos de acompanhamento, a perda média de peso foi de 7,6 kg, com 36% dos pacientes alcançando uma remissão do diabetes tipo 2. Após o período inicial de acompanhamento de dois anos, os dados foram coletados anualmente ao longo de cinco anos, acompanhando pacientes que receberam suporte dietético de baixa intensidade. Nessa fase, a população foi dividida em dois grupos: um que continuou com o suporte dietético de baixa intensidade (grupo de extensão) e outro que interrompeu a dieta. Observou-se que o grupo que não participou da extensão apresentou maiores aumentos de HbA1c e menor perda de peso. Em contraste, no grupo que manteve a dieta na fase de extensão, aproximadamente 26% dos participantes permaneceram em remissão ao final dos cinco anos. 

O estudo Look AHEAD4, com um acompanhamento de até 12 anos, avaliou o impacto de um programa intensivo que incluía uma dieta de baixa caloria (800–1200 kcal por dia), redução da ingestão total de gordura e de gordura saturada para menos de 30% e 10%, respectivamente, e aumento da atividade física para 175 minutos semanais, com atividades como caminhada rápida e outras de intensidade moderada. O objetivo foi avaliar a incidência de doenças cardiovasculares (DCV) e doença renal crônica (DRC) em participantes com e sem remissão do diabetes tipo 2 (DT2). Os resultados mostraram que os participantes que atingiram alguma remissão do DT2 apresentaram uma redução de 33% na taxa de DRC e de 40% na taxa de DCV, em comparação com aqueles que não alcançaram remissão. Essa redução de risco foi ainda maior – 55% para DRC e 49% para DCV – entre os participantes que mantiveram a remissão por pelo menos quatro anos. Além disso, observou-se que quanto maior o período de remissão, menor o tempo médio de duração do diabetes, variando de 6,0 anos entre aqueles sem remissão para 2,0 anos entre os que mantiveram remissão por quatro visitas ou mais.  

Estudos como o UKPDS, DiRECT, Look AHEAD e SOS destacam que o controle glicêmico intensivo e a perda de peso são intervenções eficazes para melhorar a sensibilidade à insulina e reduzir os níveis de glicose, contribuindo para a remissão da doença do DT2. Mesmo uma redução modesta de peso pode trazer benefícios significativos no controle glicêmico e na prevenção de complicações. As intervenções variam desde mudanças no estilo de vida e dietas de baixa caloria até opções mais invasivas, como a cirurgia bariátrica, sendo que todas compartilham o objetivo de melhorar o controle glicêmico e proporcionar benefícios de longo prazo, promovendo remissão do DT2 em muitos casos, inclusive proporcionando uma redução significativa nos riscos de complicações graves. Assim, a perda de peso continua sendo uma das abordagens mais importantes e eficazes para o manejo do diabetes tipo 2, oferecendo uma esperança significativa de melhora na qualidade de vida e na saúde a longo prazo para milhões de pessoas afetadas pela doença. 

 

Referências

  1. Holman, R. R., Paul, S. K., Bethel, M. A., Matthews, D. R., & Neil, H. A. W. (2008). 10-year follow-up of intensive glucose control in type 2 diabetes. New England Journal of Medicine, 359(15), 1577-1589. https://doi.org/10.1056/NEJMoa0806470 

  2. Holman, R. R., Paul, S. K., Bethel, M. A., Matthews, D. R., & Neil, H. A. W. (2008). Post-trial monitoring of a randomised controlled trial of intensive glycaemic control in type 2 diabetes extended from 10 years to 24 years (UKPDS 91). The Lancet, 372(9643), 1767-1776. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(08)61345-8 

  3. Lean, M. E. J., Leslie, W. S., Barnes, A. C., Brosnahan, N., Thom, G., McCombie, L., … & Taylor, R. (2023). 5-year follow-up of the randomised Diabetes Remission Clinical Trial (DiRECT) of continued support for weight loss maintenance in the UK: An extension study. The Lancet Diabetes & Endocrinology, 11(6), 400-410. https://doi.org/10.1016/S2213-8587(23)00042-8 

  4. Look AHEAD Research Group. (2019). Impact of remission from type 2 diabetes on long-term health outcomes: findings from the Look AHEAD study. Diabetes Care, 42(1), 100-108. https://doi.org/10.2337/dc18-1202 

  5. Sjöström, L., Narbro, K., Sjöström, C. D., Karason, K., Larsson, B., Wedel, H., … & Carlsson, L. M. S. (2007). Effects of bariatric surgery on mortality in Swedish obese subjects. The New England Journal of Medicine, 357(8), 741-752. https://doi.org/10.1056/NEJMoa066254 

  6. Carlsson, L. M., Svensson, P. A., & Sjöholm, K. (2020). Life expectancy after bariatric surgery in the Swedish Obese Subjects Study. The New England Journal of Medicine, 383(16), 1535-1543. https://doi.org/10.1056/NEJMoa2002449 

  7. Sjöström L, Peltonen M, Jacobson P, et al. Association of Bariatric Surgery With Long-term Remission of Type 2 Diabetes and With Microvascular and Macrovascular Complications. JAMA. 2014;311(22):2297-2304. doi:10.1001/jama.2014.5988.