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sexta-feira nov 22, 2024

Angioplastia preventiva em placas vulneráveis: estudo PREVENT

Escrito por: Dr. Alexandre Hideo-Kajita em 3 de junho de 2024

6 min de leitura

O quê? 

O PREVENT trial  foi um estudo clínico randomizado, aberto e multicêntrico incluindo 15 centros no Pacífico (Japão, Coreia do Sul, Taiwan e Nova Zelândia). O estudo avaliou se o tratamento percutâneo preventivo (PPCI) de placas vulneráveis não obstrutivas (diâmetro de estenose, DS<50%) sem restrição ao fluxo anterógrado (isto é, reserva de fluxo fracional [fractional flow reserver, FFR] >0.80) reduziria desfechos clínicos combinados, quando comparado ao tratamento clínico otimizado isolado (OMT), num período de 2 anos após a randomização (1) 

 

Por quê? 

O padrão angiográfico das lesões coronarianas que necessitam de intervenção tende a seguir uma distribuição quase gaussiana, sendo as lesões discretas e gravemente obstrutivas nos extremos da curva, enquanto as lesões intermediárias no meio da curva, visto que são mais frequentes. Assim, as lesões obstrutivas discretas e as graves são bem caracterizadas à angiografia, enquanto as lesões intermediárias não permitem uma determinação adequada da sua repercussão isquêmica exclusivamente pela angiografia. A cinecoronarioangiografia (i.e.: angiografia coronária) ainda que seja o padrão ouro para avaliação da anatômica das artérias coronárias, tem limitações, visto que é uma luminografia, ou seja, enxerga apenas a luz e não a parede do vaso, diferentemente da angiotomografia de coronárias, por exemplo.  

Nas lesões intermediárias, foram descritas entidades como a placa vulnerável.  Estudos de avaliação invasiva, como a tomografia de coerência óptica (OCT) e o ultrassom intracoronário por radiofrequência (RF-IVUS), revelaram que mesmo quando esse tipo de lesão não obstruía significativamente na luz do vaso, apresentava a tendência no aumento de eventos clínicos maiores pelo risco de instabilização da placa (i.e.: ruptura).  

 

Como? 

O estudo clinico randomizado, aberto, intention-to-treat, multicêntrico incluindo 15 centros, multinacional foi conduzido em 4 países: Japão, Coreia do Sul, Taiwan e Nova Zelândia. Foram incluídos paciente ≥18 anos, com doença coronariana (DAC) crônica ou síndromes coronarianas agudas (SCA) submetidos à cateterismo cardíaco. Todas as lesões não culpadas com diâmetro de estenose ≥50% (por estimativa visual) com FFR > 0.80 foram avaliadas para a presença de placas vulneráveis. Segundo o estudo, o método de determinação de placas vulneráveis ficou a critério do operador, seja ultrassonografia intravascular em escala de cinza (GS-IVUS), ultrassonografia intravascular por radiofrequência (RF-IVUS), combinação de ultrassonografia intravascular em escala de cinza e espectroscopia de infravermelho próximo (NIRS), ou coerência óptica tomografia (OCT). No PREVENT trial, eram necessários 2 dos 4 seguintes critérios para definir uma placa como vulnerável (conforme protocolo):  

O grupo intervenção recebeu a angioplastia coronária preventiva da lesão alvo e tratamento clínico otimizado (PCI+OMT), enquanto o grupo controle, recebeu apenas o tratamento clinico otimizado (OMT). Os pacientes foram seguidos por 2 anos.  

O desfecho primário composto foi falência do vaso alvo – Target vessel failure – TVF, a combinação de: morte de origem cardíaca, infarto agudo do miocárdio relacionado ao vaso alvo, revascularização do vaso alvo guiado por isquemia, e hospitalização por angina instável ou progressiva. Quanto aos defechos secundários, foram: morte por qualquer causa, qualquer infarto do miocárdio, qualquer revascularização, trombose definitiva do stent, acidente vascular cerebral (AVC), eventos hemorrágicos, estado de angina, complicações do procedimento e o composto orientado ao paciente de morte por todas as causas, todos os infartos do miocárdio ou qualquer revascularização repetida. 

E aí? 

Ao todo, dos 5627 pacientes triados, foram incluídos 1606 pacientes na análise, sendo: 803 no grupo controle (841 lesões) e 803 no grupo intervenção (831 lesões). A mediana de idade foi de 65anos (IQR 58-71), 73% dos pacientes eram do sexo masculino, 31% de diabéticos, 84% de angina estável, e 64% de revascularização da lesão alvo exclusivamente. Após 2 anos de seguimento, o desfecho primário combinado ocorreu em 0.4% (n=3) do grupo intervenção e 3.4% (n=27) do grupo controle com diferença absoluta de -30% (95% IC –4·4 para –1·8]; p=0·0003). Não foi observada diferença estatisticamente significativa entre os grupos nos componentes individuais do desfecho primário combinado. 

 

E agora? 

Primeiramente devemos pontuar que a gênese da placa aterosclerótica e a entidade da vulnerabilidade de placa é por si só complexa e permanece como objeto de estudo. Dito isso, independentemente do desenho do estudo e dos critérios adotados pelos investigadores, a avaliação de redução de desfechos clínicos no tratamento percutâneo com implante de stent farmacológico preventivo de lesões não obstrutivas com caracteristicas de vulnerabilidade de placa (segundo os critérios do estudo) é um longo salto de causalidade, considerando os múltiplos fatores e interações possíveis. 

Atualmente o unico tratamento com efetividade comprovada no cenário de placas vulneráveis é a terapia medicamentosa com estatinas de alta potência em altas doses. Os estudos com avaliação invasiva com OCT mostraram uma redução do conteudo da placa e um espessamento da camada fina, levando a uma tendência de estabilização da lesão ao longo do tempo. Entrentanto, no PREVENT trial, uso de estatina de altas doses não era obrigatório e foi deixado a critério do investigador. 

Vale pontuar que 9% dos pacientes (n =79) do grupo intervenção passaram para o grupo controle (OMT), e 1% do grupo controle (n=12) passou para o grupo intervenção, por demanda espontânea ou do investigador, embora a análise por intenção de tratar tenda a causar um viés em direção à hipótese nula neste tipo de estudo. Além disso, o desenho do estudo não é sham controled e 9% de lesões tratadas apresentavam limitação de fluxo, o que por si só não condiz com os critérios de lesão alvo.  Por último, 2 dispositivos diferentes com resultados clinicos não equivalentes foram usados no tratamento das lesões alvo. No grupo ICP preventiva, 237/729 dos pacientes e 5/12 pacientes que migraram do grupo OMT para o grupo intervenção receberam scaffolds bio-absorviveis. No estudo ao todo, 33% (242/741) dos pacientes receberam scaffolds bio-absorvivel, e os outros 67% stents farmacológicos metálicos. Possivelmente pelo tempo de recrutamento prolongado (6 anos), o que leva a uma relação de triagem de 5.2 pacientes/por centro/mês, com uma taxa de recrutamento médio de 1.5 pacientes/por centro/mês. 

Há critérios validados para avaliação de vulnerabilidade de placa por imagem invasiva e o GS-IVUS por si só não permite essa determinação (2-5). De modo que no PREVENT trial, 95% dos pacientes foram acessados por GS-IVUS, mais de 97% das lesões foram definidas como placas vulneráveis por apresentarem os critérios 1 (ALM/MLA <4,0 mm²) e 2 (PB >70%). Assim, apenas 11% apresentavam NIRS com max LCBI 4mm >315*, e 5% contavam com critérios para fibroateroma de capa fina (Thin-Cap Fibroatheroma – TCFA) avaliados pelo RF-IVUS ou OCT. O que significa que, se todos os pacientes com critérios 3 ou 4 apresentem como segundo para vulnerabilidade de placa os critérios 1 ou 2, apenas 263 dos 1606 pacientes (16%) apresentavam algum critério efetivo para avaliação de imagem invasiva que pudesse sugerir a presença de vulnerabilidade de placa (dados da Tabela 1). 

Logo, estamos diante a um estudo que avaliou: a revascularização coronária percutânea preventiva guiada por GS-IVUS (97%) de leões não obstrutivas à angiografia de pacientes com angina estável (84%), sem evidência de isquemia no vaso alvo FFR >0.8 (91%), com plataformas de próteses diferentes no mesmo grupo: scaffolds bio-absorvivel (33%) e stents farmacológicos metálicos (67%). Diante dessas limitações, futuros estudos devem ser aguardados a fim de se determinar o paper da ICP preventiva em placas vulneráveis.  

Referências

  1. Park SJ, Ahn JM, Kang DY, Yun SC, Ahn YK, Kim WJ, Nam CW, Jeong JO, Chae IH, Shiomi H, Kao HL, Hahn JY, Her SH, Lee BK, Ahn TH, Chang KY, Chae JK, Smyth D, Mintz GS, Stone GW, Park DW; PREVENT Investigators. Preventive percutaneous coronary intervention versus optimal medical therapy alone for the treatment of vulnerable atherosclerotic coronary plaques (PREVENT): a multicentre, open-label, randomised controlled trial. Lancet. 2024 May 4;403(10438):1753-1765. doi: 10.1016/S0140-6736(24)00413-6.  

  2. Stefanadis C, Antoniou CK, Tsiachris D, Pietri P. Coronary Atherosclerotic Vulnerable Plaque: Current Perspectives. J Am Heart Assoc. 2017 Mar 17;6(3):e005543. doi: 10.1161/JAHA.117.005543.  

  3. Erglis A, Jegere S, Narbute I. Intravascular Ultrasound-based Imaging Modalities for Tissue Characterisation. Interv Cardiol. 2014 Aug;9(3):151-155. doi: 10.15420/icr.2014.9.3.151. 

  4. van Veelen A, van der Sangen NMR, Delewi R, Beijk MAM, Henriques JPS, Claessen BEPM. Detection of Vulnerable Coronary Plaques Using Invasive and Non-Invasive Imaging Modalities. J Clin Med. 2022 Mar 1;11(5):1361. doi: 10.3390/jcm11051361.  

    1. Waksman R, Di Mario C, Torguson R, Ali ZA, Singh V, Skinner WH, Artis AK, Cate TT, Powers E, Kim C, Regar E, Wong SC, Lewis S, Wykrzykowska J, Dube S, Kazziha S, van der Ent M, Shah P, Craig PE, Zou Q, Kolm P, Brewer HB, Garcia-Garcia HM; LRP Investigators. Identification of patients and plaques vulnerable to future coronary events with near-infrared spectroscopy intravascular ultrasound imaging: a prospective, cohort study. Lancet. 2019 Nov 2;394(10209):1629-1637. doi: 10.1016/S0140-6736(19)31794-5.