Edoxabana na hipertensão pulmonar por doença tromboembolica - MDHealth - Educação Médica Independente
quarta-feira dez 18, 2024

Edoxabana na hipertensão pulmonar por doença tromboembolica

Escrito por: Remo H. M. Furtado em 26 de março de 2024

4 min de leitura

O quê?

O estudo KABUKI (Clinical Trial to Investigate Safety and Efficacy of Edoxaban in Patients with CTEPH) foi um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, aberto com avaliaçao cega de desfechos, conduzido no Japão a fim de avaliar a eficácia e segurança da edoxabana em pacientes com tromboembolismo pulmonar (TEP) e hipertensão pulmonar (HP) secundária.

Por quê?

Em pacientes com TEP crônico e HP secundária, a anticoagulação plena com antagonistas de vitamina K (AVK) é recomendada por tempo indeterminado a fim de reduzir a progressão da doença. Os DOACs (direct acting oral anticoagulants) são medicamentos com maior comodidade de uso e melhor perfil de segurança em relação à varfarina e outros AVK. Entretanto, não se sabe a eficácia e segurança dos DOACs na HP secundária a TEP crônico.

Como?

O estudo KABUKI incluiu pacientes com histórico de TEP e HP secundária em 11 centros do Japão. Os pacientes elegíveis deveriam ter HP com classe funcional I-III da OMS e deveriam já estar em uso de varfarina por pelo menos 3 meses. Pacientes submetidos a reperfusão ou em uso de vasodilatadores eram elegíveis. Os pacientes foram randomizados para varfarina (com INR-alvo de 1,5 a 2,5) versus edoxabana 60 mg 1 vez/dia (com redução de dose pela metade em caso de peso < 60 kg).

O desfecho primário do estudo foi a taxa da resistência vascular pulmonar (RVP) entre a semana 48 de tratamento e valor o basal. Os desfechos secundários foram a piora clínica da HP, classe funcional OMS, distância no teste de caminhada de 6 minutos e níveis de NT-pro-BNP. A incidência de tromboembolismo venoso (TEV) e níveis de dímero-D foram desfechos exploratórios, enquanto a ocorrência de sangramento clinicamente relevante foi o desfecho de segurança.

O estudo foi desenhado com a margem de não-inferioridade de 1,188 (ou seja, o limite superior do intervalo de confiança [IC] 95%) na razão entre a média geométrica de queda na RVP entre o grupo edoxabana e varfarina.

 

E aí?

Ao todo, foram randomizados 74 pacientes, sendo 37 randomizados para cada grupo. A idade média foi de 63,6 anos, sendo 62% do sexo feminino. O TTR (time on therapeutic range) dos pacientes do grupo varfarina foi de 79,7% considerando-se o INR-alvo 1,5-2,5.

Na análise principal por protocolo, que incluiu um total de 72 pacientes (36 em cada grupo), a taxa entre as médias geométricas das quedas de RVP entre edoxabana e varfarina foi de 0,92 (IC 95% 0,82-1,03; P < 0,001 para não-inferioridade). A pressão sistólica na artéria pulmonar foi semelhante entre os grupos (19 mmHg no grupo edoxabana versus 20 mmHg no grupo varfarina; diferença média na mudança em relação ao basal entre os dois grupos de 0,2 mmHg; IC 95% -2,0 a 3,3). Não houve diferença nos níveis de dímero-D, NTproBNP, nem no teste de caminhada de 6 minutos entre os grupos. Ocorreram dois sangramentos clinicamente relevantes, sendo um em cada grupo.

 

E agora?

O estudo KABUKI foi o primeiro estudo randomizado a avaliar a possibilidade de uso de DOAC em pacientes com HP secundária a TEP crônico. Até então, restava somente a opção do uso de AVK nestes pacientes. Como os DOACs são medicamentos com perfil de segurança melhor (sobretudo para sangramento intracraniano), melhor comodidade de uso e apresentam menos interações medicamentosas em relação ao AVK, a ampliação de indicação de seu uso a esta população constitui um importante avanço terapêutico.

O estudo tem algumas limitações importantes. Primeiro, por se tratar de estudo feito somente no Japão, não se sabe ao certo se seus dados são reprodutíveis em outras etnias ou em outras partes do mundo. No entanto, em se tratando de um medicamento como edoxabana, cuja eficácia na FA e TVP já foram documentadas em diversas populações, é de se esperar que isto não seja um problema. Em segundo lugar, o uso de INR-alvo entre 1,5 e 2,5 segue o que é aprovado para TEP crônico no Japão, embora o TTR tenha sido de 59% levando-se em conta o INR-alvo tradicional de 2,0 a 3,0. Em terceiro lugar, em virtude

de seu pequeno tamanho, não se pode concluir acerca das diferenças de sangramento ou outros desfechos clínicos entre os dois grupos.

Em resumo, no TEP crônico com HP, o DOAC edoxabana foi não-inferior à varfarina no tocante à queda de RVP em 48 meses. Com isso, o uso de edoxabana como opção de anticoagulação no TEP crônico é uma medida a ser considerada na prática clínica.

Referência

  1. Hosokawa K, Watanabe H, Taniguchi Y, Ikeda N, Inami T, Yasuda S, Murohara T, Hatano M, Tamura Y, Yamashita J, Tatsumi K, Tsujino I, Kobayakawa Y, Adachi S, Yaoita N, Minatsuki S, Todaka K, Fukuda K, Tsutsui H, Abe K; KABUKI Investigators. A Multicenter, Single-Blind, Randomized, Warfarin-Controlled Trial of Edoxaban in Patients With Chronic Thromboembolic Pulmonary Hypertension: KABUKI Trial. Circulation. 2024; 149(5): 406-409.

Sobre o autor

Remo H. M. Furtado

Diretor de Pesquisa do BCRI, Coordenador da Pós-graduação em Pesquisa Clínica da Galen Academy e Professor Colaborador da Faculdade de Medicina da USP

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