O quê?
O estudo ORBITA-2 foi um estudo duplo-cego, randomizado e controlado por placebo para avaliar a intervenção coronária percutânea (ICP) em pacientes com angina estável.
Por quê?
A ICP é frequentemente realizada para reduzir os sintomas da angina estável. No entanto, ainda não se sabe se a ICP alivia mais a angina do que um procedimento placebo em pacientes que sem medicação antianginosa. Os resultados do estudo ORBITA (Objective Randomized Blinded Investigation with Optimal Medical Therapy of Angioplastia in Stable Angina), um ensaio de ICP, placebo-controlado, no qual o uso de medicamentos antianginosos era obrigatório segundo as diretrizes, não conseguiu mostrar benefício significativo da ICP no tempo de exercício em esteira. No entanto, é possível que a ausência de diferença entre ICP e placebo tenha sido atribuída ao elevado número de medicamentos antianginosos inicialmente. A terapia antianginosa intensiva pode ser difícil de alcançar na prática clínica, em parte devido aos efeitos colaterais e à não-adesão ao tratamento prescrito, e há casos em que os pacientes podem preferir a ICP ao aumento da terapia medicamentosa. O ensaio ORBITA-2 foi desenhado para avaliar o efeito da ICP em comparação com um procedimento placebo em pacientes com angina estável que não estariam recebendo medicação antianginosa incialmente.
Como?
Foi realizado um estudo duplo-cego, randomizado e placebo-controlado para investigar a ICP em pacientes com angina estável. Todos os medicamentos antianginosos foram suspensos 14 dias antes da randomização para avaliação dos sintomas. Os participantes foram randomizados a serem submetidos a ICP ou procedimento placebo, em uma proporção de 1:1, e foram acompanhados por 12 semanas.
O desfecho primário foi o escore de sintomas de angina, que foi calculado diariamente com base no número de episódios de angina ocorridos em um determinado dia, no número de medicamentos antianginosos prescritos naquele dia e nos eventos clínicos, incluindo a ocorrência de não-cegamento por angina inaceitável reportada, síndrome coronariana aguda ou morte. As pontuações variam de 0 a 79, sendo que pontuações mais altas indicam pior estado de saúde associado à angina.
Estrutura PICOT | |
Population: | Pacientes com angina estável |
Intervention | Intervenção coronária percutânea |
Control: | Procedimento placebo |
Outcome | Escore de sintomas de angina |
Time | 12 semanas |
E aí?
O recrutamento desse estudo ocorreu entre Novembro de 2018 e Junho de 2023, onde um total de 923 pacientes foram avaliados quanto à elegibilidade. Destes pacientes, 439 foram inscritos na fase de avaliação dos sintomas pré-randomização e 301 foram posteriormente designados aleatoriamente para ICP (151 pacientes) ou placebo (150 pacientes). A média de idade (±DP) foi de 64±9 anos e 79% eram homens. A isquemia estava presente em um território coronariano em 242 pacientes (80%), em dois territórios em 52 pacientes (17%) e em três territórios em 7 pacientes (2%). Nos vasos-alvo, a mediana da reserva de fluxo fracionário foi de 0,63 (intervalo interquartil, 0,49 a 0,75) e a mediana da razão de pressão instantânea livre de onda foi de 0,78 (intervalo interquartil, 0,55 a 0,87). No acompanhamento de 12 semanas, a pontuação média dos sintomas de angina foi de 2,9 no grupo ICP e 5,6 no grupo placebo (OR: 2,21; IC: 95%, 1,41-3,47; P<0,001). Um paciente no grupo placebo apresentou angina inaceitável que levou à revelação do cegamento. Síndrome coronariana aguda foi reportada por 4 pacientes no grupo ICP e por 6 pacientes no grupo placebo.
E agora?
Neste ensaio clínico placebo-controlado em pacientes com angina estável que estavam recebendo pouca ou nenhuma medicação antianginosa e que apresentavam estenose de artérias coronárias associada a isquemia, a ICP resultou em uma pontuação de sintomas de angina mais baixa do que o procedimento placebo, indicando um melhor estado de saúde ligado à angina. A menor pontuação de sintomas de angina pareceu resultar de um menor número de episódios diários de angina. Ao grupo ICP foi associada uma probabilidade de ficar livre de angina três vezes superior às probabilidades equivalentes associadas ao grupo placebo, durante o seguimento de 12 semanas. O alívio da angina após ICP foi observado imediatamente e persistiu durante toda a fase de acompanhamento.
O estudo ORBITA forneceu evidências da base ética, viabilidade e necessidade de ensaios controlados por placebo para avaliação de ICP. Nesse contexto, o estudo ORBITA-2 ressalta a necessidade de testar um procedimento intervencionista coronariano sem a interferência do uso de terapia antianginosa que pudesse atenuar seu efeito sobre sintomas.
No entanto, apesar de décadas de avanços técnicos na ICP, incluindo a introdução de stents, o efeito da ICP no tempo de exercício em esteira no estudo duplo-cego ORBITA-2 ainda foi 37 segundos menor do que os 96 segundos atribuído à angioplastia com balão no estudo não-cego ACME (Angioplasty Compared to Medicine), realizado há 30 anos atrás. O efeito da ICP como monoterapia foi uma diferença de 59,5 segundos no tempo de exercício em esteira comparado ao procedimento placebo, mas foi similar de 48 – 55 segundos alcançados com um único medicamento antianginoso em dose plena.
Neste estudo, em pacientes com angina estável que estavam em uso de pouca ou nenhuma medicação antianginosa e que tinham evidência objetiva de isquemia, a ICP resultou em um escore de sintomas de angina mais baixo do que um procedimento placebo, indicando um melhor estado de saúde associado à angina. Ainda que conflituoso, para o tratamento de pacientes com angina estável podemos considerar, como alternativa a todo arsenal medicamentoso disponível, a indicação da ICP para reduzir sintomas.