O quê?
Um estudo randomizado, duplo-cego, fase 1, testou o uso do siRNA (small interfering RNA) zilebesiran versus placebo em pacientes com hipertensão arterial sistêmica (HAS).
Por quê?
A tecnologia do siRNA vem sendo desenvolvida na medicina no tratamento de diversas doenças, incluindo as doenças cardiovasculares. Este fragmento de RNA é capaz de silenciar a transcrição gênica de determinados genes-alvo, com isso possibilitando ampliar os efeitos terapêuticos, por tempo prolongado, e com pequena possibilidade de efeitos colaterais em virtude da terapia direcionada. O zilbesiran é capaz de silenciar a transcrição gênica do angiotensinogênio, com isso levando à inibição do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA).
Como?
O estudo fase 1 avaliou a tolerabilidade e efeitos sobre a concentração de angiotensinogênio do zilebesiran em indivíduos entre 18 e 65 anos com diagnóstico de HAS. Pacientes com histórico de diabetes ou de evento CV prévio foram excluídos, assim como o foram os pacientes em uso de betabloqueadores.
O estudo testou múltiplas doses de zilebesiran via injeção subcutânea (SC), e incluiu também grupos em uso concomitante de ibesartana, um bloqueador de angiotensina 2. Além disso, em um grupo foi avaliada a interação do efeito do zilebesiran com dieta pobre e rica em sal. Cada paciente recebia uma única injeção SC (em doses variando de 10 a 800 mg) ou placebo.
O desfecho primário do estudo era a frequência de eventos adversos, sendo a mudança dos níveis de angiotensinogênio um desfecho secundário. O efeito anti-hipertensivo do zilebesiran foi um desfecho exploratório, sendo avaliado por meio de monitorização ambulatorial da pressão arterial de 24 h (MAPA-24 h) em 6, 8, 12 e 24 semanas após a administração da injeção SC do medicamento do estudo.
Estrutura PICOT | |
Population: | Pacientes com HAS |
Intervention | Zilebesiran SC injeção única |
Control: | Placebo |
Outcome | Eventos adversos |
Time | 24 semanas |
E aí?
Ao todo, foram incluídos 107 pacientes, com idade média de 53,5 anos, sendo 62% do sexo masculino e 66% da raça branca. A PA sistólica média na MAPA-24 h no basal era de 140,3 mmHg, e a PA diastólica de 87,1 mmHg.
A frequência de eventos adversos foi similar nos grupos zilebesiran e placebo (72% versus 88%, respectivamente). Não houve qualquer relato de hipotensão, hipercalemia ou evento adverso renal no estudo. Houve o aparecimento transitório de anticorpos anti-medicamento em baixo título em 2 pacientes. O uso do zilebesiran levou a reduções sustentadas dos níveis de angiotensinogênio, proporcional às doses utilizadas, mantidas até 24 semanas após a injeção SC (a redução variou de 40 a 99%, a depender da dose utilizada). Este efeito redutor do angiotensinogênio não foi atenuado por uma dieta rica em sódio, nem pelo uso concomitante de irbesartana.
O uso do zilebesiran se associou a reduções da PA tanto sistólica quanto diastólica na MAPA-24 h, chegando a uma redução média de 22,5 mmHg e 10,8 mmHg, respectivamente, com a maior dose do medicamento (800 mg SC). Os efeitos redutores da PA do zilebesiran foram revertidos por uma dieta rica em sódio. A adição de ibesartana se associou a uma queda adicional média de 6,3 e 3,0 mmHg, respectivamente, na PA sistólica e diastólica, na MAPA-24 h.
E agora?
A tecnologia do siRNA foi uma importantíssima descoberta na medicina, tendo inclusive resultado em um Prêmio Nobel aos seus descobridores. Diversos estudos estão explorando esta nova estratégia terapêutica em múltiplas áreas da medicina. A longa duração dos efeitos dos siRNA torna o tratamento bastante conveniente, em virtude de a administração SC poder ser feita me intervalos de meses.
É importante ressaltar que os resultados anteriormente descritos, embora promissores, ainda se trata de um estudo fase 1. Neste tipo de estudo, o objetivo primordial é avaliação da tolerabilidade e de efeitos farmacológicos iniciais. Por esta razão, o leitor pode perceber que não se menciona valor de P ou outras medidas de inferência estatística nas comparações de segurança. Eventos como hiperpotassemia e disfunção renal, por exemplo, podem não ter ocorrido em virtude da pequena quantidade de pacientes expostos ou tempo de exposição muito curto. Ainda assim, os resultados possivelmente levarão a futuros estudos fase 2, haja vista a boa tolerabilidade do zilebesiran, o excelente efeito sobre o alvo terapêutico (com redução próximo a 100% dos níveis de angiotensinogênio) e, principalmente, o potencial efeito aditivo com outros inibidores do SRAA. Quando os estudos fase 2 e 3 saírem, a comunidade científica poderá confirmar ou não se teremos um tratamento inovador para os pacientes com HAS.