Resultados de estudo fase 3 apontam potencial do maralixibate em promover melhora do prurido e sobrevida do fígado nativo em pacientes com PFIC
O quê?
Trata-se de um estudo multicêntrico, randomizado, duplo cego, controlado por placebo para avaliar a segurança e eficácia do maralixibate em pacientes com diferentes tipos de colestase intra-hepática familiar progressiva.
Por quê?
As colestases intra-hepáticas familiares progressivas (PFICs) são um grupo de doenças genéticas raras de herança autossômica recessiva que se caracterizam por prejuízo na formação da bile, resultando em colestase e prurido. Atualmente, há mais de 10 tipos de PFICs conhecidos, as mais comuns delas sendo a PFIC2, causada pela deficiência da bomba exportadora de sais biliares (BSEP, codificada pelo gene ABCB11) e a PFIC3, causada pela deficiência da proteína de resistência multidrogas 3 (MDR3, codificada pelo gene ABCB4). As PFICs são uma das principais causas de transplante hepático pediátrico.
O maralixibate é um medicamento de uso oral que atua como inibidor do transportador de ácido biliar ileal (IBAT). Em 2021, ele foi aprovado nos EUA para o tratamento de prurido em pacientes com síndrome de Alagille. Além disso, em um estudo anterior aberto de longo prazo, o medicamento promoveu melhora do prurido em pacientes com PFIC2. Além do maralixibate, outro inibidor de IBAT, o odevixibate, havia sido avaliado em pacientes com PFIC1 e PFIC2 em um estudo placebo controlado, com impactos também na redução do prurido e nos níveis de ácidos biliares. Entretanto, até a realização deste estudo, não havia nenhum outro estudo placebo controlado que tivesse avaliado o potencial de um inibidor de IBAT em outros tipos de PFICs.
Como?
O estudo foi realizado em 29 centros em 16 países, incluindo o Hospital Sírio Libanês no Brasil. Foram incluídos pacientes com diagnóstico clínico de PFIC e idade entre 12 meses e 18 anos. Os participantes precisavam ter prurido persistente e evidência de doença progressiva. Após o período de triagem, os participantes elegíveis foram alocados de forma aleatória, na proporção de 1:1 para maralixibate ou placebo. A dose inicial foi de 142,5 µg/kg duas vezes ao dia e foi escalonada até a dose máxima de 570 µg/kg duas vezes, conforme tolerado. A eficácia foi avaliada por meio do escore de gravidade ItchRO(Obs) e dos níveis de ácidos biliares. Os dados dos pacientes com doença relacionada ao BSEP (PFIC2) foram avaliados de forma separada da análise do grupo todo. As análises englobaram tanto a população de intenção de tratamento
Estrutura PICOT
Population: Pacientes com diagnóstico clínico de PFIC, idade de 12 meses a 18 anos, prurido persistente e evidência bioquímica e/ou patológica de doença hepática progressiva.
Intervention: Maralixibate em doses de até 570 µg/kg duas vezes ao dia
Control: Placebo
Outcome: Mudança no escore de gravidade ItchRO(Obs) entre a avaliação basal e 12 semaans de tratamento. Mudança nas concentrações de ácidos biliares entre a avaliação basal e a média das semanas 18, 22 e 26. Proporção de pacientes com melhora de prurido e ácidos biliares.
Time: 26 semanas
E aí?
Foram incluídos 93 participantes (47 no grupo maralixibate e 46 no grupo placebo). No grupo maralixibate, 3 pacientes descontinuaram e 44 completaram o estudo; no grupo placebo, 4 pacientes descontinuaram e 42 completaram o estudo. Na coorte PFIC2, o grupo com maralixibate teve uma redução mais acentuada na média dos mínimos quadrados do escore de prurido quando comparado ao placebo (-1,7 vs -0,6), bem como nos níveis de ácios biliares (-176 µmol/L vs +11 µmol/L). Achados similares ocorreram na coorte incluindo todas as PFICs, tanto nos escores de prurido (-1,8 vs -0,6) como nos níveis de ácidos biliares (-157 µmol/L vs +3 µmol/L). Em relação a segurança, 5 pacientes no grupo maralixibate tiveram eventos adversos sérios, contra 3 pacientes no grupo placebo. Um paciente no grupo maralixibate descontinuou o tratamento devido a uma diarreia leve. Quatro participantes no grupo maralixibate e um participante no grupo placebo necessitaram reduzir a dose. Os motivos para a redução da dose foram sintomas gastrointestinais e aumento de aminotransferases.
E agora?
Os resultados do estudo apontam para a eficácia do maralixibate no tratamento do prurido colestático e na redução dos níveis de ácidos biliares em pacientes com PFIC. Além disso, o medicamento foi de um modo geral seguro e bem tolerado. O principal evento adverso associado ao tratamento (diarreia) foi geralmente de intensidade leve a moderada e transitório. Com esses resultados, a bula do medicamento foi atualizada nos EUA, expandindo a indicação do maralixibate também para pacientes com PFICs. Embora o maralixibate não seja aprovado na Anvisa, outro medicamento da mesma classe, o odevixibate, foi aprovado em 2023 para pacientes com PFIC no Brasil. Espera-se que os inibidores de IBAT sejam incorporados futuramente ao SUS representando uma alternativa não cirúrgica para reduzir o acúmulo de ácidos biliares nessa condição.