Doenças Raras na Infância: Tratamento para Distrofia Muscular de Duchenne tem Terapia Gênica Aprovada pela ANVISA - MDHealth - Educação Médica Independente
terça-feira jan 14, 2025

Doenças Raras na Infância: Tratamento para Distrofia Muscular de Duchenne tem Terapia Gênica Aprovada pela ANVISA

Escrito por: Samara Alves em 14 de janeiro de 2025

4 min de leitura

Estudo EMBARK demonstra que delandistrogene moxeparvovec demonstra uma tendência de melhora em desfechos funcionais

 

A Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) é uma doença neuromuscular rara e genética que afeta predominantemente meninos. Ela se manifesta desde o nascimento, com déficits motores perceptíveis e fraqueza muscular geralmente surgindo por volta dos 3 anos de idade, progredindo com o tempo. A função muscular das crianças com DMD começa a se deteriorar devido à lesão muscular progressiva após os 6 anos de idade, com perda da capacidade de andar e complicações cardiorrespiratórias graves. A DMD ocorre devido a uma mutação genética no gene DMD, que codifica a proteína distrofina. A distrofina é essencial para a integridade das fibras musculares, e sua ausência resulta em danos contínuos às células musculares e perda progressiva da função motora. Como o gene DMD é ligado ao cromossomo X, a doença é mais comum em meninos do que meninas, pois possuem apenas um cromossomo X. 

Recentemente, em dezembro de 2024, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) aprovou o primeiro produto de terapia gênica para tratar a DMD no Brasil: o delandistrogene moxeparvovec. Esta terapia é direcionada para crianças deambulantes, com idades entre 4 e 7 anos, oferecendo esperança de uma melhor qualidade de vida para os pacientes e suas famílias. Até então, o tratamento padrão inclui corticosteroides, que embora ajudem a melhorar a função muscular, não abordam eficazmente a progressão contínua da doença. A terapia gênica visa tratar a doença corrigindo ou substituindo o gene defeituoso responsável pela produção da proteína distrofina. 

No caso do delandistrogene moxeparvovec, a terapia gênica utiliza um vetor viral do tipo rAAVrh74 para entregar um gene que codifica uma versão modificada da proteína distrofina, conhecida como micro-distrofina, diretamente nas células musculares. O objetivo da terapia é restaurar a expressão da distrofina e melhorar a função muscular. O vetor rAAVrh74 foi utilizado devido à sua alta eficiência de transdução e baixa prevalência sérica em pacientes com DMD.  

O estudo fase 3 EMBARK foi conduzido para avaliar a eficácia e segurança do delandistrogene moxeparvovec em 125 pacientes meninos com idades entre 4 e 8 anos. Esses pacientes foram randomizados em uma proporção de 1:1 para receber uma única infusão intravenosa de delandistrogene moxeparvovec (1,33 × 1014 genomas de vetor por quilograma) ou placebo. Para todos os pacientes, no dia anterior à infusão, além da dosagem estável de corticosteroides orais de base, a dosagem padrão de corticosteroides de rotina foi mantida. Prednisona foi administrada a uma dose de 1 mg kg−1 d−1 para suprimir possíveis eventos adversos causados pela resposta imunológica ao vetor AAV. Este regime de prednisona continuou por pelo menos 60 dias, alcançando uma dose total máxima de 60 mg d−1, após o qual a dosagem foi reduzida até o nível pré-infusão. 

Os resultados do estudo indicaram que o delandistrogene moxeparvovec demonstra uma tendência de melhora em vários desfechos funcionais importantes. Houve melhorias secundárias, como no tempo para levantar (−0,64 segundos), caminhar 10 metros (−0,42 segundos) e subir escadas (−0,36 segundos) no grupo tratado. Além disso, a expressão de micro-distrofina foi significativamente maior nos pacientes tratados, alcançando 34,29% comparado a 0% no grupo placebo após 12 semanas, sugerindo uma resposta biológica robusta à terapia gênica. 

Apesar das melhorias observadas nos desfechos clínicos secundários, o estudo não alcançou um desfecho primário estatisticamente significativo na avaliação da North Star Ambulatory Assessment (NSAA), uma medida padrão para avaliar a capacidade motora dos pacientes com DMD. Após 52 semanas, houve uma média de mudança de 2,57 para o grupo tratado contra 1,92 para o grupo placebo, indicando que os pacientes tratados ainda apresentam um declínio progressivo, embora mais lento, em sua função motora. 

Em termos de segurança, o delandistrogene moxeparvovec demonstrou um perfil gerenciável. Foram registrados um total de 674 eventos adversos no grupo tratado e 514 no grupo placebo. No grupo que recebeu delandistrogene moxeparvovec, 48 pacientes (76,2%) experimentaram 235 eventos adversos relacionados ao tratamento, a maioria ocorrendo dentro dos primeiros 90 dias após a infusão; 83,3% dos eventos foram leves a moderados em gravidade e 98,3% dos quais se resolveram espontaneamente. Um total de 7 pacientes (11,1%) experimentaram 10 eventos adversos sérios relacionados ao tratamento. Não houve mortes ou descontinuações relacionadas ao tratamento. Esses dados mostram que a terapia é segura e alinhada com os resultados de estudos anteriores. 

A aprovação excepcional do delandistrogene moxeparvovec pela ANVISA foi baseada na gravidade da DMD e na ausência de alternativas terapêuticas para os pacientes. Os benefícios demonstrados no estudo EMBARK superaram os riscos associados, oferecendo uma alternativa terapêutica para pacientes que possuem poucas ou nenhuma opção de tratamento disponível para evitar a progressão do declínio ao longo do tempo. Os dados iniciais do estudo indicam que, embora a terapia não tenha alcançado todos os objetivos de eficácia, a capacidade de gerar micro-distrofina pode indicar um caminho promissor para o tratamento da DMD. Certamente, o estudo e a aprovação do delandistrogene moxeparvovec no Brasil abrem caminhos a terapia gênica no tratamento de doenças genéticas raras, como a Distrofia Muscular de Duchenne. 

Confira mais informações sobre Distrofia Muscular de Duchenne em: https://mdhealth.com.br/noticias-e-destaques/distrofia-muscular-de-duchenne-atualizacao-das-recomendacoes-do-consenso-brasileiro/ 

Referências

  1. Mendell JR, Muntoni F, McDonald CM, et al. AAV gene therapy for Duchenne muscular dystrophy: the EMBARK phase 3 randomized trial. Nat Med. 2024. Disponível em: https://doi.org/10.1038/s41591-024-03304-z

  2. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Anvisa aprova registro de primeiro produto de terapia gênica para distrofia muscular de Duchenne (DMD). [Internet]. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2024/anvisa-aprova-registro-de-primeiro-produto-de-terapia-genica-para-distrofia-muscular-de-duchenne-dmd