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segunda-feira nov 11, 2024

Distrofias musculares congênitas: estudo CALLISTO

Escrito por: Fabiano de Oliveira Poswar em 27 de junho de 2024

4 min de leitura

Medicamento direcionado ao mecanismo da doença foi avaliado em pacientes com distrofias musculares congênitas relacionadas à laminina alfa2 e ao colágeno tipo 6

 

O quê? 

As distrofias musculares congênitas são um grupo de doenças caracterizadas por fraqueza e atrofia musculares com início congênito ou no primeiro ano de vida. Na maioria dos casos, a alteração genética ocorre em uma das proteínas relacionadas à matriz extracelular e sua interação com a membrana do músculo e resultam em aumento da creatina cinase (CK) e um padrão distrófico na biópsia muscular (Topaloğlu & Poorshiri, 2023).   

O estudo CALLISTO foi um estudo de fase 1, realizado entre 2014 e 2018 para avaliar as características farmacocinéticas do omigapil em três doses ascendentes em crianças e adolescentes com duas das formas mais comuns de distrofias musculares congênitas. O resultado da pesquisa foi disponibilizado recentemente na revista Neurology Genetics (Foley et al., 2024). 

 

Por quê? 

O omigapil é uma molécula pequena que atua como um anti-apoptótico, inibindo a morte celular dependente de p53. O medicamento, também conhecido como TCH346, foi anteriormente avaliado em ensaios clínicos de fase II/III em pacientes com doença de Parkinson (DP) e esclerose lateral amiotrófica (ELA), porém as pesquisas para essas condições foram descontinuadas por falta de eficácia (Olanow et al., 2006; Miller et al., 2007). 

Apesar disso, com a verificação de que a apoptose desempenha um papel importante no mecanismo das distrofias musculares relacionadas à laminina alfa2 (LAMA2-RD) e ao colágeno tipo 6 (COL6-RD), foi proposto que ele poderia ser benéfico para essas condições. Estudos em modelos murinos de LAMA2-RD confirmaram o potencial do omigapil, que promoveu aumento do peso, da capacidade de locomoção e da sobrevida (Erb et al., 2009). No modelo animal de COL6-RD, por sua vez, houve melhora do músculo diafragmático e da integridade mitocondrial muscular. O estudo CALLISTO buscou então verificar seu potencial na LAMA2-RD e COL6-RD com o objetivo inicial de verificar o perfil farmacocinético, sua segurança e tolerabilidade, bem como a viabilidade se se realizar estudos adicionais com avaliações clínicas relevantes. 

 

Como? 

Foram selecionados pacientes com diagnóstico de LAMA2-RD ou COL6-RD, confirmado por avaliação genética ou imuno-histoquímica de biópsia muscular. Eles foram divididos em três coortes com doses ascendentes (0,02 mg/kg/dia; 0,08 mg/kg dia; e uma coorte com a dose determinada por um método adaptativo). A avaliação farmacocinética realizada a partir das doses administravas buscava replicar o alvo de dose determinado nos estudos em modelos animais. Um comitê de segurança supervisionou o estudo, avaliando a segurança e os dados de farmacocinética antes da progressão das doses. Os pacientes foram avaliados clinicamente e por meio de escalas e testes para avaliação motora e respiratória. Foi realizado também ressonância dos membros inferiores e coletado sangue e urina para biomarcadores. 

 

Estrutura PICOT 

Population: 10 pacientes com LAMA2-RD e 10 pacientes com COL6-RD com idades entre 5-16 anos 

Intervention: Omigapil 0,02 mg/kg/dia – 0,08 mg/kg/dia 

Control: Estudo aberto. 

Outcome: Primário: avaliação do perfil farmacocinético e determinação da dose; Secundário: segurança e tolerabilidade. Terciário: viabilidade de conduzir estudos com avaliações clínicas relevantes. 

Time: 28 semanas 

 

E aí? 

O estudo não conseguiu identificar nenhuma melhora clinicamente relevante em parâmetros respiratórios e motores ao final do tratamento, mas essa melhora não era esperada em um intervalo curto de tempo como o proposto pelo estudo e a avaliação de eficácia não era um de seus objetivos. Por outro lado, os pesquisadores conseguiram determinar a dose de 0,06 mg/kg/dia como a dose ótima para pacientes com LAMA2-RD e COL6-RD com base no perfil farmacocinético. O medicamento mostrou-se seguro e não foram observados eventos adversos sérios. Os eventos adversos reportados como relacionados ao medicamento foram desidratação, hipotensão, em um paciente, e náusea em outro. Os pacientes conseguiram realizar as avaliações clínicas motoras e respiratórias, assim como biomarcadores em sangue e urina. Houve, porém, uma variabilidade significativa em estudos de função pulmonar, possivelmente influenciada por fatores como infecções recorrentes e níveis de exaustão.  

 

E agora? 

O estudo CALLISTO destacou-se por ser o primeiro ensaio clínico a avaliar os efeitos de uma molécula pequena para pacientes com distrofias musculares congênitas LAMA2-RD ou COL6-RD. Embora nenhuma conclusão possa ser feita em relação à eficácia do medicamento, os dados do CALLISTO ajudarão a planejar um novo estudo com essa finalidade. Um desafio evidenciado é a variabilidade identificada entre as avaliações, o que é algo crítico para doenças raras, como as distrofias congênitas musculares, em que a amostra é muito pequena. Nesse sentido, uma avaliação com biomarcadores em sangue e urina, ainda em andamento, poderá auxiliar na definição de desfechos substitutos.  

Referências

  1. Erb M, Meinen S, Barzaghi P, et al. Omigapil ameliorates the pathology of muscle dystrophy caused by laminin-alpha2 deficiency. J Pharmacol Exp Ther. 2009;331(3):787-795. 

  2. Foley AR, Yun P, Leach ME, et al. Phase 1 Open-Label Study of Omigapil in Patients With LAMA2- or COL6-Related Dystrophy. Neurol Genet. 2024;10(3). doi:10.1212/nxg.0000000000200148 

  3. Miller R, Bradley W, Cudkowicz M, et al. Phase II/III randomized trial of TCH346 in patients with ALS. Neurology. 2007;69(8):776-784. doi:10.1212/01.wnl.0000269676.07319.09 

  4. Olanow CW, Schapira AH, LeWitt PA, et al. TCH346 as a neuroprotective drug in Parkinson’s disease: a double-blind, randomised, controlled trial. The Lancet Neurology. 2006;5(12):1013-1020. doi:10.1016/s1474-4422(06)70602-0 

  5. Topaloğlu H, Poorshiri B. The congenital muscular dystrophies. Annals of the Child Neurology Society. 2023;2(1):27-39. doi:10.1002/cns3.20050  

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