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segunda-feira out 14, 2024

Pegvaliase para fenilcetonúria: resultados de longo prazo

Escrito por: Fabiano de Oliveira Poswar em 11 de julho de 2024

4 min de leitura

Publicados os resultados de eficácia e segurança de longo prazo da terapia de substituição enzimática com pegvaliase em pacientes com fenilcetonúria 

 

O quê? 

Trata-se de uma análise de longo prazo da pegvaliase para pacientes com fenilcetonúria. Foram utilizados os dados finais dos ensaios clínicos de fase 3 PRISM-1, PRISM-2 e do estudo de extensão 165-304. 

 

Por quê? 

A fenilcetonúria (FNC) é um erro inato do metabolismo causado pela deficiência da enzima fenilalanina hidroxilase, responsável pela reação de hidroxilação do aminoácido fenilalanina em tirosina. Indivíduos com fenilcetonúria, quando não tratados, apresentam aumento acentuado dos níveis de fenilalanina e redução dos níveis de tirosina no sangue e no cérebro. Isso resulta em manifestações neurológicas como deficiência intelectual, alterações comportamentais e epilepsia, além de hipopigmentação da pele, xerodermia e um odor característico.   

 

O tratamento da FNC é principalmente dietético e envolve uma dieta restrita em proteína natural e outros alimentos ricos em fenilalanina e suplementada com fórmula metabólica isenta de fenilalanina. Com a identificação precoce e uma adesão estrita ao tratamento dietético pessoas com FNC tem uma vida normal, sem qualquer sequela. Isso motivou a inclusão da FNC em programas de triagem neonatal no mundo inteiro. Entretanto, mesmo com diagnóstico precoce, a adesão a um tratamento dietético rígido pela vida inteira pode ser desafiadora para muitos pacientes, especialmente após a adolescência.  

 

Recentemente, uma forma recombinante e PEGilada da enzima bacteriana fenilalanina amônia liase, a pegvaliase, foi aprovada para comercialização após demonstrar eficácia para o tratamento da FNC. A pegvaliase é hoje uma alternativa terapêutica para pacientes com fenilcetonúria maiores de 16 anos e com níveis elevados de fenilalanina. Entretanto, por sua origem bacteriana, a formação de anticorpos antidroga e a ocorrência de efeitos adversos são esperadas durante o tratamento. Assim, dados sobre a segurança e eficácia no longo prazo são importantes para guiar a decisão terapêutica em pacientes elegíveis. 

 

Como? 

Foi realizada uma análise dos dados dos participantes dos estudos sequenciais de fase 3 PRISM-1 e PRISM-2 e do estudo de extensão 165–304. O estudo PRISM-1 foi um ensaio clínico aberto, em que os pacientes foram alocados de forma aleatória para diferentes doses de pegvaliase (20 ou 40 mg/dia). O estudo PRISM-2 foi um estudo duplo cego placebo controlado de descontinuação, que incluiu participantes do estudo PRISM-1. Em uma das quatro partes do PRISM-2, os participantes foram alocados de forma aleatória para continuar o tratamento ou receber placebo por 8 semanas. Um escalonamento para a dose de até 60 mg também era oferecido na última parte do PRISM-2. O estudo 165-304 incluiu participantes do PRISM-2 com o objetivo de avaliar a segurança e eficácia de longo prazo da pegvaliase em doses acima de 40 mg/dia.  

 

Estrutura PICOT 

Population: Pacientes adultos com fenilcetonúria e níveis de fenilalanina > 600 µmol/L incluídos no estudo PRISM-1 

Intervention: Pegvaliase em doses de 20 a 60 mg/dia 

Control: Placebo 

Outcome: Proporção de pacientes com níveis de fenilalanina abaixo de 600, 360 e 120 µmol/L. 

Time: 36,6 meses em média 

 

E aí? 

Foram incluídos os 261 pacientes provenientes do estudo PRISM-1, bem como os dados desses pacientes nos estudos subsequentes. A média de tempo de tratamento foi de 36,6 meses (0,5 a 89,3 meses). Ao total 101 (38%) pacientes descontinuaram o tratamento, mais da metade deles no PRISM-1, sendo um terço nos primeiros 3 meses. O principal motivo para descontinuar foram eventos adversos de hipersensibilidade como artralgia, reações no sítio de infusão e cefaleia. 26 (10%) dos pacientes apresentaram anafilaxia e três (1,1%) apresentaram reações de hipersensibilidade sistêmica aguda grave. 

 

Ao todo, 186 (71,3%) atingiram níveis de fenilalanina abaixo de 600 µmol/L. Entre os 75 que não atingiram, 67 tinham descontinuado a pegvaliase precocemente após um tempo de tratamento médio de 7,7 meses. Houve uma grande variação no tempo e dose necessários para obter uma resposta terapêutica. A mediana de tempo necessária para essa redução foi de 4,4 meses, enquanto que para que fossem atingidos níveis de fenilalanina menores ou iguais a 120 µmol/L foi necessária uma mediana de 11,6 meses. A maioria dos pacientes necessitou de doses acima de 20 mg para obter uma resposta inicial; em alguns casos doses de até 60 mg/dia foram necessárias. 

 

E agora? 

Embora requeira atenção especial devido ao risco de reações de hipersensibilidade, o tratamento de longo prazo com pegvaliase tem mostrado benefícios significativos para os pacientes que respondem ao medicamento. A maioria desses pacientes alcança níveis de fenilalanina abaixo de 120 µmol/L após cerca de um ano de tratamento. No Brasil, a pegvaliase foi aprovada pela Anvisa no início de 2024. No entanto, o medicamento ainda não está incluído nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS, nem no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Espera-se que os dados deste estudo contribuam para uma avaliação crítica sobre o papel da terapia de substituição enzimática no tratamento da fenilcetonúria.

Referência

  1. Harding CO, Longo N, Northrup H, et al. Pegvaliase for the treatment of phenylketonuria: Final results of a long-term phase 3 clinical trial program. Molecular Genetics and Metabolism Reports. 2024;39:101084. doi:10.1016/j.ymgmr.2024.101084 

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